O exigente tirocínio pelos territórios matenses, forneceu-me o “know-how” necessário para encarar o mapa da Herdade da Lage do Meio Dia, palco da distância média, com um tal à vontade, que fiquei embasbacado com a minha desenvoltura na leitura do terreno. A passo, sem pressão e…com óculos, é realmente outra coisa.
- “Não engulam tudo aquilo que ele vos conta. Lembrem-se que andava na “cola” de um professor conceituado. Se fosse sozinho atascava-se pela certa”.
Confesso que esta zona é mais acessível, apesar de bastante arborizada, o que retira alguma visibilidade, mas também cria alguns limites de vegetação, todavia estou em crer, que a vão considerar simplesmente magnífica para a prática da modalidade. Espero que aceitem esta humilde opinião, de um tipo que bateu intensamente toda aquela área, durante mais de quatro horas (é obra, não é?), que até as luras dos coelhos poderia identificar.
Em pouco mais de um quilómetro quadrado, abunda uma das maiores concentrações de pedraria para todos os gostos, muros e cercas para chatear, zonas limpas para deleite daqueles moços mais rápidos, raríssima vegetação intransponível, linhas de água pronunciadas e toda esta profusão de detalhes para um relevo bem recortado – o verdadeiro sonho do orientista. Eu sei que quando a esmola é muita o pobre desconfia, mas no final dar-me-ão razão.
Como sou um saco roto, a minha capacidade para guardar segredos é ínfima e assim como assim, estamos em época natalícia e vou oferecer mais uma dica à rapaziada. Não se iludam com a pretensa facilidade deste mapa, porque o responsável pelos traçados dos percursos, quando deparou com cinquenta e muitos pontos marcados numa área tão exígua, afivelou um tal sorriso maléfico, que não pressagiava grandes abébias. Notem que há quem lhe chame o “rei das gincanas”, o que para bom entendedor, meia palavra basta. Conto não ter batido demais com a língua nos dentes, pois ainda me arrisco a ser banido do núcleo duro, mas o meu coração de manteiga fala mais alto, desejando o melhor para os meus amigos.
Um outro aspecto de crucial importância para o bom desenrolar do processo, é sem dúvida nenhuma, a empatia com os proprietários dos terrenos a utilizar. Direi mais, sem a sua boa vontade não se efectuaria qualquer prova de Orientação. Daí o nosso cuidado em tratá-los com todo o respeito, usando níveis de persuasão consideráveis, de modo a conseguirmos levar a água ao moinho.
Explicar-lhes que as cercas que forem derrubadas, serão novamente repostas; que há necessidade de abrir portões; deslocar gado para outros pastos de forma que não haja colisões com nenhuma vaca distraída ou algum porco mais molengão; convencê-los que os muros não serão demolidos pelos atletas mais atabalhoados; passar a mensagem que um dos códigos de conduta da família orientista se baseia na preservação da natureza, em suma, usar toda uma retórica que os leve a compreender, que são eles o elo mais forte da cadeia.
E nesta área, o GD4C tem o privilégio de encontrar nas suas fileiras um mestre na dialéctica. Ninguém resistiu à sua argumentação, mesmo aqueles que demonstravam maior renitência, acabaram por concordar e aceder às nossas propostas. Uma vitória em toda a linha, que nos permitiu levar por diante o plano inicialmente traçado.
Como consequência desta eloquente dissertação, o evento vai apresentar no dia de abertura uma Arena exemplar, onde se irão concentrar o secretariado, bar, partidas e chegadas, localizada a escassos metros do aparcamento e baby-sitting, tudo se conjugando para que a “festa” possa ser de arromba. A simpática aldeia, que tão depressa se identificou com o evento, merece-o com certeza.
Tenho a noção de que vou cometer mais uma inconfidência, mas não resisto a partilhar com vocês, que a partida será pouco menos que supersónica, num terreno completamente limpo e em declive (alguns terão de usar travões ABS para não baterem no muro do triângulo) e que as chegadas vão dar ensejo a uma emocionante apoteose (à medida duma etapa WRE), com uma “faiena” balizada pelo centro da praça de touros e meta no campo de futebol.
Quanto ao segundo dia, os pormenores ainda se encontram em estado embrionário. No entanto, a Organização tem em cima da mesa três hipóteses, estando a envidar todos os esforços para disponibilizar uma Arena que tenha o mínimo de dignidade. Tudo depende neste momento, das condições climatéricas na altura da prova, da reparação de um estradão em tempo útil e da possibilidade de se poder deslocar uma manada de vacas arraçadas (leia-se, com mau humor) para outro local.
Seja qual for a solução escolhida (ou possível), podem estar descansados que o superior interesse dos atletas ficará salvaguardado. Se assim não for (o que nos desgostará profundamente), mentalizem-se para uma pernada de largas centenas de metros com a mochila às costas ou um percurso de quilómetro e meio em todo o terreno, com lama a saltar até aos tejadilhos. Situações a que não estejamos mais que habituados, mas alguém me confidenciou que os “deuses” não o irão permitir…oremos.
A pedido de várias famílias, o NAOM uma vez mais vai oferecer um sprint nocturno, que levará os interessados a percorrer toda a localidade do Crato. Procedeu-se à escolha de alguns pontos, confirmando a possibilidade de várias opções de progressão, sobretudo na zona do centro histórico, que dado apresentar um razoável declive e vielas em abundância, pode proporcionar pernadas interessantes. Por motivo de obras, apenas se lamenta a impossibilidade de se utilizar a área do castelo, que daria um toque ainda mais medieval a todos os trajectos.
No intuito de aumentar a área do mapa, conseguiu-se arrastar os percursos para a parte nova da vila, conferindo-lhes um maior equilíbrio competitivo, atingindo assim quase meia centena de pontos, onde se “inventou” um excepcional local para a quarentena, paredes-meias com as partidas e chegadas. Os amantes deste género de etapas vão-nos agradecer.
Para terminar a estadia em beleza e para que a tradição do NAOM se continue a manter, recebemos uma óptima notícia de última hora, respondendo a uma das nossas pretensões, a confirmar que a Câmara do Crato patrocinaria o jantar de sábado – tudo está bem, quando acaba bem.
Não me quero alongar mais, que a prosa já vai extensa, mas dadas as circunstâncias vejo-me obrigado a fazer um apelo. Parem de me enviar emails a implorar que eu “bufe” pormenores sobre os percursos. Nem quero saber de prenda nenhuma, porque a minha boca vai continuar a ser um túmulo. E escusam de invocar a alma da minha santa avozinha, que não vou mudar de opinião. Não entendem que essas atitudes levianas, podem configurar crime de lesa-Orientação? É verdade que o tema dos textos abordava “a outra face”, mas definitivamente não era a “oculta”.