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Isabel Rato é uma artista multifacetada entre compositora, arranjadora, pianista, professora e produtora musical.
Entre várias valências, destaca-se principalmente no Jazz e na Música Erudita, com alguns discos editados. O seu primeiro álbum data de 2016 “Para Além da Curva da Estrada”. Em 2019, o seu segundo disco sai com o nome de “Histórias do Céu e da Terra”, sendo considerado pela revista jazz.pt como um dos melhores discos do ano do estilo a nível nacional. O seu mais recente trabalho discográfico é “Luz” lançado a 1 de Maio de 2022.
O seu quinteto é formado por João David Almeida na voz, João Capinha nos saxofones (soprano, alto e tenor), João Custódio no contrabaixo e Alexandre Alves na bateria.
A sua formação musical começou desde pequenina, em quecom apenas cinco anos dá os primeiros passos no piano com a Professora Julieta Boavida. Em paralelo teve aulas de ballet clássico e entrou em espectáculos de teatro, dança e música.
Mais tarde, com 12 anos, estudou guitarra clássica e eléctrica em Cascais, onde residia.
Segue os estudos de piano em Música Clássica e Improvisada, Guitarra Clássica, entre outras disciplinas associadas, onde também passou pelo estudo de canto.
A sua licenciatura em Piano Jazz na Escola Superior de Música de Lisboa, teve como mentor e professor o pianista João Paulo Esteves da Silva.
A sua vida profissional inicia-se com 18 anos como pianista e teclista de vários artistas e bandas da música portuguesa de renome tais como Despe e Siga, Linha da Frente, Mikkel Solnado, Samuel
Quedas, Chen Liony, Carolina Deslandes, Maria João e Mário Laginha, Luís Represas e Corvos.
Participou no “The Voice” da RTP em que tocou com vários artistas destacando Daniela Mercury e Rui Reininho.
Agora é a vez de Isabel Rato passar os conhecimentos aos seus alunos lecionando Piano Jazz e Piano Clássico em várias escolas na região de Lisboa, tais como: Escola de Jazz do Hot Clube de Portugal; e Escola de Música Michel Giacometti em Cascais.
Participa regularmente em espectáculos e festivais de Jazz ao longo do país, com o seu quinteto ou mesmo com outro tipo de formação em palco.
AMMA: Começa a aprender piano e ballet aos cinco anos. Embora tivesse sido opção dos pais, em sua casa já se tinha o gosto formado na área da música e do espectáculo?
Isabel Rato: Sei que os meus pais sempre gostaram muito de música, mas o gosto começou mesmo com o início das aulas de piano do meu irmão mais velho. A música começou a fazer parte das nossas vidas. Tenho uma vaga ideia de ter aulas ainda de flauta no Teatro Gil Vicente em Cascais, mesmo antes da vinda do piano acústico para a nossa casa.
AMMA: O seu irmão João Nuno, mais velho, influenciou-a em alguma fase da sua formação e mesmo na carreira?
IR: Omeu irmão João foi fundamental no meu percurso escolhido, sem dúvida. Sempre foi uma enorme inspiração e ajudou-me sempre muito. Tive muita sorte. Sempre foi um músico extraordinário, com uma capacidade de estudo e trabalho impressionantes!! Desde muito novo que é assim.
AMMA: Pára o ballet, continua com o piano e aprende guitarra, tanto clássica como eléctrica. Como surgiu o gosto pela guitarra? O que a fez parar o ballet?
IR: Não me recordo porque deixei as aulas de ballet, talvez por ser muita carga horária. A guitarra surgiu também por influência do meu irmão. É um instrumento incrível e que me preenchia de uma outra forma bem diferente do piano. E pelo facto de ser um instrumento portátil, podia levar a guitarra para todo o lado, para a escola, para a praia… Sempre foi uma grande companheira.
AMMA: Quais foram as maiores dificuldades porque passou na caminhada da aprendizagem musical e mesmo para entrar neste mercado?
IR: Sempre adorei estudar. Talvez algumas disciplinas mais exigentes que me tomaram mais tempo, ou que não me eram tão naturais foram mais difíceis. Alguns professores mais duros. As dificuldades de ser músico são várias. Penso que é preciso muito um espírito de luta e perseverança. Ser persistente e muito trabalhador. Estar verdadeiramente preparado para ter uma vida mais inconstante, a todos os níveis.
AMMA: Portugal é um país onde se possa dedicar à carreira musical inicial como profissão, ou os músicos no seu início de carreira na maioria das vezes têm que ter outra fonte de rendimento?
IR: Penso que para se ter uma fonte de rendimento mais estável será sempre melhor ter outra fonte de rendimento. Eu sou professora de piano há mais de 20 anos, comecei muito cedo. É algo que sempre fez sentido para mim; estar directamente ligada à pedagogia e ajudar o aluno da melhor forma que me for possível. Comecei com aulas particulares e depois em Escolas de Música. Penso que se for a vontade verdadeira do aluno, seguir Música, deve seguir a sua vocação. Mas, também deverá ter plenamente a noção do trabalho que envolve esta profissão e a sua precariedade.
AMMA: Como podemos inverter isso? Dar mais valor aos artistas, apostar nas suas carreiras e haver mais mecenato?
IR: Penso que não há um apoio à Cultura em condições, comparando com outros países da Europa por exemplo. Dá-se pouco valor às Artes em Portugal nomeadamente a estilos de música mais específicos como é o caso do Jazz. Passa também pela Educação, pelos programas das Escolas que não têm uma grande abertura ainda às Artes, em geral. Tem de existir uma maior política cultural.
AMMA: Numa altura tem uma formação muito completa em Música Clássica e Improvisada, Guitarra Clássica, Teoria, Harmonia, Voz, Coro e História da Música. Todas elas interligadas foram decisivas para o sucesso da sua carreira?
IR: Este conjunto de disciplinas foram fundamentais para a minha aprendizagem e desenvolvimento, e também canalizá-las o mais possível para o meu instrumento principal - o Piano, tanto na Música Clássica, mas também no Jazz e na improvisação.
AMMA: Mesmo com várias valências de estilos musicais, o Jazz foi “amor à primeira vista”? O que mais lhe fascina neste estilo?
IR: A liberdade da improvisação. O Jazz oferece-nos uma imensidão de possibilidades que não tem fim. A relação e interacção entre os músicos, essa vivência é Única.
AMMA: Que grandes artistas de Jazz a influenciam?
IR: São muitos, penso que os mais importantes serão: Keith Jarrett, Bill Evans, Brad Mehldau, Wayne Shorter, Shai Maestro, Fred Hersch, entre muitos outros.
AMMA: Ao compor os seus temas, ou mesmo fazer arranjos musicais a uma peça, qual é a grande fonte de inspiração?
IR: Penso que hoje em dia, qualquer sensação, momento, sentimento, imagem, lugar, pode despoletar o processo criativo. A Pintura sempre foi muito importante para mim, e uma fonte enorme de inspiração. Viajar também…
AMMA: Quanto tempo levou a preparar o seu primeiro disco “Para Além da Curva da Estrada” em 2016?
IR: Não me recordo bem, mas talvez dois anos, já tinha peças compostas anteriormente.
AMMA: É difícil conseguir editar um trabalho discográfico em Portugal? Os artistas têm os apoios que necessitam?
IR: Não há muitos apoios, essa é a verdade. Editar na área do Jazz é quase um trabalho por conta própria, eu tive a sorte de ter a Editora Nischo, na área do Jazz, com o apoio do Carlos Martins e da Constanze Jurgens. Mas Editoras na área do Jazz não são praticamente nenhumas… O músico acaba por fazer uma Edição de Autor.
AMMA: Agora cada vez mais com acesso a disponibilizar trabalhos nas plataformas digitais, continua a preferir gravar o disco, ou no futuro pensa dedicar-se ao digital?
IR: Penso continuar a gravar discos e fazer sempre uma edição física em CD, mesmo que sejam menos cópias. Mas mantendo sempre o digital, e lançar o disco nas várias plataformas.
AMMA: Já que falamos em discos, tem algum trabalho em preparação para ser editado para breve?
IR: Sim, estamos neste momento a preparar o meu 4º disco, “Vale das Flores”, dedicado inteiramente à música em português, com temas de José Afonso, Sérgio Godinho e temas tradicionais portugueses, tendo em vista as comemorações dos 50 anos do 25 de Abril. Será editado no início de 2024. Vamos para estúdio em Novembro.
AMMA: Pelos inúmeros locais por onde já actuou, qual o que a marcou mais?
IR: Pergunta muito difícil. Penso que o Teatro de Bragança foi um local magnífico de tocar. E o concerto em 2019 na Festa do Jazz, no Capitólio, foi uma data muito importante para mim e para o grupo. E por último, ter tocado com a Elisa Rodrigues na Irlanda.
AMMA: Qual é a sua percepção relativa à “saúde” do Jazz em Portugal?
IR: Temos uma comunidade de músicos espectacular, grandes instrumentistas e compositores também, mas com pouco espaço para se poder tocar e divulgar esta música.
AMMA: Como professora, há muita procura por parte dos alunos para aprender piano Jazz?
IR: Penso que há cada vez mais procura. Estou a dar aulas de piano tanto em Cascais como em Lisboa no Hotclube de Portugal, Escola de Jazz, e temos uma procura imensa de aulas de piano, ao ponto de não ser possível inscrever todas as pessoas…
AMMA: Em média quantos anos um aluno tem que se dedicar, estudando com frequência, para se lançar no mundo do espectáculo?
IR: Penso que pode haver muitas hipóteses… Depende muito do aluno e do seu estudo, da forma como vive a Música….
AMMA: Tem alunos seus a trabalhar já de forma autónoma no mercado da música Jazz?
IR: Sim, tenho alunos que passaram por mim, seguiram e estão a seguir Música, seja no Jazz ou no Pop.
AMMA: É gratificante ser professora? O que tenta passar aos seus alunos para além da componente teórica e prática?
IR: Ser professora para mim é ajudar e ensinar o mais possível, e respeitar sempre o aluno.
AMMA: Qual é o seu sonho enquanto compositora, professora, artista nesta arte?
IR: O meu sonho é estar bem, ser feliz, poder estar com as pessoas de quem gosto na música e na vida. Viajar muito. Enquanto professora, poder sempre melhorar e ajudar os meus alunos a encontrarem o seu caminho. Enquanto compositora, gostaria de continuar a escrever música e fazer arranjos para mim e para outros artistas. Enquanto pianista, continuar sempre a tocar o mais possível, em vários estilos também, não só no Jazz.
AMMA: O seu filho está a seguir os passos da mãe?
IR: Tenho um menino de 3 anos, o Gabriel. Ainda é cedo, mas ele gosta muito de música.
AMMA: Pensa em colocá-lo em escola de música, ou prefere que seja uma decisão dele, sem o querer influenciar?
IR: Vamos inscrevê-lo sim, em escola de música. Para nós a Música é uma disciplina fundamental para o seu desenvolvimento, para a sua formação, para a sua evolução. Este é um dos grandes problemas do Ensino em Portugal, na minha opinião, esta lacuna enorme no ensino que não dá valor nem importância às Artes.
AMMA: Pensando na sua carreira e experiência, o que gostava de deixar aos mais novos, potenciais grandes músicos como mensagem?
IR: O que mais posso deixar aos mais novos é que sejam acima de tudo felizes, sejam saudáveis, que sejam estudiosos e dedicados; que se divirtam a fazer música e a tocar; que explorem ao máximo!!!
Texto: Pedro MF Mestre
Fotos: Filipa Oliveira