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Quando poucos decidem contra muitos

 

A recente divulgação pela Federação Portuguesa de Atletismo (FPA) do calendário competitivo para 2015/2016 revela a decisão que já se prefigurava de eliminação dos campeonatos nacionais de 50 km marcha. Como é sabido, a decisão já vinha de trás (tinha sido tomada em 2014 para valer em 2015) e revelou-se de tal modo inconsistente que acabou revertida antes de produzir efeito, após os protestos dos marchadores. A insistência da FPA na abolição dos campeonatos de 50 km marcha traduz a obstinação federativa de acabar com os campeonatos nacionais desta distância olímpica apenas «porque sim».
 
Até hoje, em nenhum momento se encontrou qualquer justificação oficial (válida ou inválida) para esta atitude. No entanto, são conhecidos alguns argumentos que em certos momentos mais ou menos informais certos dirigentes da federação invocaram para tentar fundamentar a decisão. Um desses argumentos relacionava-se com a dificuldade de organizar a prova dos 50 km marcha nos campeonatos nacionais de marcha em estrada. Estranho argumento, este, dado que nunca se viu nenhuma organização queixar-se de dificuldades específicas com essa prova no contexto de uns campeonatos cujo programa reunia provas de várias distâncias para todos os escalões etários – os 50 km eram apenas uma das provas do programa e não acarretavam nenhum problema específico.
 
Outro desses argumentos centrava-se na ideia de que são poucos os marchadores interessados num campeonato nacional de 50 km. Este argumento mereceria desde logo um comentário introdutório: quando uma federação hostiliza os seus especialistas numa dada distância (como sucedeu com os atletas de 50 km marcha nos anos recentes), não pode depois esperar que eles se mantenham motivados e participem nos campeonatos nacionais como se andassem bem tratados pelos dirigentes federativos (departamento técnico incluído). Mas, deixando essa questão de lado, haveria então que perguntar se a regra da quantidade de participantes é para aplicar a todos os campeonatos nacionais. É que, se assim for, então será talvez de esperar por notícias próximas dando conta da exclusão de outras provas de atletismo do programa de campeonatos nacionais da modalidade. Não se fará aqui referência específica a qualquer outra prova ou concurso do programa dos campeonatos nacionais (Campeonatos de Portugal de Atletismo), mas não deixará de se mencionar que, apenas nos últimos três anos (2013, 2014 e 2015), nada menos que 16 competições registaram quantidade de participantes inferior a oito. Em alguns casos, ser último foi suficiente para subir ao pódio e receber medalha. Note-se que este apanhado se limitou às três últimas edições dos Campeonatos de Portugal de Atletismo.
 
É claro que só a título retórico se poderia questionar a continuidade de todas aquelas provas e concursos nos campeonatos nacionais de atletismo. Analogamente, a ideia de acabar com os campeonatos de 50 km marcha não deveria passar da cabeça de qualquer dirigente após uma noite mal dormida, talvez com pesadelos, de que se refizesse logo pela manhã, com a frescura da aurora a devolver sensatez onde antes tivesse perpassado algum pesadelo nocturno. Só que não foi isso que aconteceu e o pesadelo tornou-se realidade para os marchadores portugueses.
 
Por fim, outra pretensa justificação que se ouviu a responsáveis estaria na despesa que advinha da organização dos campeonatos de 50 km. Ora, francamente, também aqui surge uma pergunta lógica e inevitável: se os 50 km tinham o campeonato inscrito no programa geral dos campeonatos nacionais de marcha em estrada, como se pode afirmar que se baixa a despesa pelo simples facto de retirar essa distância do programa, mantendo todas as outras provas? A despesa com um campeonato nacional de marcha em estrada não varia pelo facto de ter nove provas em vez de dez, já que os serviços a contratar são os mesmos. Quando muito, poupava-se em garrafas de água disponibilizadas pela organização, mas por certo não era por aí que os campeonatos haveriam de ficar mais caros ou mais baratos. Logo, o argumento da despesa não faz sentido, peca por fraco. Ainda para mais, os campeonatos nacionais de marcha em estrada continuam a realizar-se, sem a prova de 50 km; mas de forma autónoma surgem agora dois campeonatos nacionais, um com provas de 20 km (27 de Fevereiro, na Batalha) e outro com provas de 35 km (23 de Janeiro, Porto de Mós), que pode interessar a alguém em especial, mas não interessa seguramente a quem estivesse preocupado com a questão da despesa, agora sim em duplicado. Portanto, aí está um tiro no pé (se calhar ainda valeria a pena perguntar por que razão ambas as provas têm lugar no distrito de Leiria, mas isso talvez fosse querer esgravatar em demasia).
 
Em contrapartida a tudo isto, lembra-se aqui que as provas de 50 km dos campeonatos nacionais de marcha em estrada desde o ano 2000 registaram menos de oito participantes em cinco ocasiões, mas em sete edições tiveram mais de dez atletas à partida, com relevo para os campeonatos organizados em Ponte de Sor (2000), que registaram nada menos que 19 concorrentes na prova longa. Ainda que, por vezes, com o concurso de alguns estrangeiros, a verdade é que termos em Portugal provas de marcha de 50 km com 10, 12 ou 14 portugueses à partida é bastante interessante (é o mínimo que se pode dizer). Compare-se essa participação com o que se tem verificado nos campeonatos de Portugal de distâncias longas de corrida e talvez tenhamos uma ideia mais exacta do que afinal significa a participação em nacionais de marcha de 50 km.
 
Para tentar compreender as motivações por trás da exclusão dos campeonatos nacionais de 50 km marcha e à falta de justificação oficial, a única coisa que se pode dizer é que alguns dirigentes e técnicos da FPA perseguem o desejo mal escondido e inconfessado de acabar com esta prova custe o que custar, mesmo que tal não passe de um desígnio meramente pessoal. O problema é que os prejudicados são os do costume. Sendo o prejuízo maior aquele que resulta para o atletismo enquanto modalidade no seu todo.
 
O Marchador
 
 

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quinta-feira, 28 de março de 2024 – 08:51:00

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